*Dani Balbi e Diana Conrado
A reserva de vagas, também conhecida como “cotas”, é uma política pública que busca promover equidade social, proporcionando oportunidades e acesso às instituições públicas e, em alguns casos, privadas, tanto para ensino, quanto para compor o quadro de servidores de órgãos e entidades públicas.
O objetivo desta política é aumentar a inclusão social de pessoas pertencentes a grupos sub-representados, enfrentando desafios decorrentes das disparidades econômicas, sociais, educacionais, geográficas e limitações sociais.
Em 2000, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), aprovou a Lei 3.524, que passou a reservar 50% da vagas de graduação para estudantes que cursaram integralmente o ensino fundamental e médio em escolas públicas, foi o que estabeleceu o art. 2°, inciso I, alínea “a”, da referida lei.
Posteriormente, em 2001, a Lei 3.708 destinou 40% das vagas para candidatos autodeclarados negros na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e na Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF).
As ações afirmativas para cotas de autodeclarados negros em universidades representam uma reparação histórica diante da violência e opressão sofridas pela população negra no Brasil, desde a escravidão.
Após a abolição, a população negra permaneceu enfrentando a marginalização e privação de condições básicas. As cotas foram um meio de reverter essa exclusão, permitindo a ascensão social deste grupo.
No caso das pessoas com deficiência, o art. 93 da Lei 8213/1991, instituiu reserva de vagas nas empresas com mais de 100 funcionários. Esta lei completou 32 anos em julho de 2023. Trata-se da política pública de cotas mais antiga do país, que surgiu devido a resistência das empresas em contratar pessoas com deficiência, resultando em uma extrema vulnerabilidade social, problema hoje vivido por travestis e transexuais.
No entanto, ao abordar as semelhanças entre as políticas de cotas para grupos sociais específicos e a necessidade de cotas para travestis e transexuais, é crucial destacar a trajetória histórica e a marginalização dessa população.
Travestis e pessoas transexuais, sendo aquelas pessoas cujas identidades de gênero não se alinham ao sexo atribuído ao nascimento, enfrentam desafios únicos, incluindo violência, exclusão social e dificuldade de acesso ao mercado de trabalho.
Tais entraves sociais sofridos pela população trans, remontam aos anos 1960, quando Ditadura Civil-Militar se instaurou (1964). À época, travestis eram perseguidas, presas e mortas, em razão disso, muitas migraram para Europa fugindo da violência.
Todo esse histórico evidencia a indubitável necessidade de políticas equitativas, tais como as que foram criadas para a população negra e pessoas com deficiência, decorrentes do abismo social em comparação à sociedade geral.
Nesse toar, a necessidade de cotas específicas para travestis e transexuais é imediata, visando proporcionar maiores oportunidades de trabalho e combater a invisibilidade dessa população, cujas condições sociais e históricas as colocam à margem.
Isso porque garantir o acesso de pessoas trans à educação mediante uma política de reserva de vagas no ensino superior é uma forma de reduzir o ciclo de marginalização, pobreza e falta de acesso ao emprego em que estão imersas.
O sucesso da política de cotas na promoção da mobilidade social aos demais grupos minorizados, demonstram que essa é imprescindível para emancipar e garantir cidadania às populações vulneráveis.
As cotas vão abrir as portas da universidade e do mercado de trabalho formal para travestis e transexuais, e mudar o cenário de marginalização.
Só assim, o país que mais mata pessoas trans no mundo, pode se tornar o país que mais emprega pessoas trans no mundo – este é nosso sonho neste mês da visibilidade trans.
*Dani Balbi é deputada estadual e pré-candidata à prefeitura do Rio de Janeiro (PCdoB); Diana Conrado é advogada da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha do editorial do jornal Brasil de Fato RJ.
Edição: Jaqueline Deister
*Brasil de Fato