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Por Theófilo Rodrigues

A metáfora é bem conhecida. O Partido Comunista é como um trem. Num trem, ao longo de seu caminho, passageiros entram e saem. Nem todos os que entram permanecem necessariamente até o fim. Mas, independente desses passageiros ocasionais, o trem segue seu destino até a estação final. No Partido Comunista muitos entram em determinados momentos da luta política com a intenção de ali permanecer até o fim de suas vidas. Em outras situações, por motivos diversos, alguns saem. Lenin tinha até mesmo uma expressão para definir esses passageiros de jornada curta: eram os “companheiros de viagem inseguros”. Mas o fato é que o partido segue seu rumo até a estação final, qual seja, a sociedade sem classes, a sociedade sem propriedade privada, a sociedade sem Estado, a sociedade em que nenhum homem possa oprimir outro homem. Os que ficam até o fim são os que chamamos de comunistas.

Ao longo de sua quase centenária história, pelo Partido Comunista passaram alguns desses “companheiros de viagem inseguros”. Isso é compreensível em qualquer partido que se pretenda de massas. Por falta de convicção programática, por desejos individuais que se sobrepõem ao coletivo ou por divergências de tática ou estratégia, alguns “companheiros de viagem inseguros” abandonam o partido. Afinal de contas, ser comunista é uma opção cotidiana, dizia Diógenes Arruda. Mas alguns desistem dessa opção. Na maior parte das vezes esses companheiros são respeitosos e, mesmo na divergência, reconhecem no partido a bela escola da formação do novo homem e da nova mulher do futuro. Os comunistas mantêm admirável respeito por esses companheiros. Há, contudo, momentos em que antigos “companheiros” operam saídas desrespeitosas. Nessas ocasiões, esperam-se respostas pedagógicas que coloquem os pingos nos “is”.

Diferente do que ocorre em outros partidos, em que vigora apenas o centralismo imposto de cima para baixo por uma figura mítica ou burocrática – as duas tipologias de Weber caem como uma luva para descrever dois partidos da centro-esquerda brasileira -, no Partido Comunista o centralismo é democrático, ou seja, construído de forma transparente de baixo para cima, do organismo de base do bairro até o seu Comitê Central. Na bela expressão de Álvaro Cunhal, trata-se de um “partido com paredes de vidro”.

Diferente de outros partidos que fazem ouvidos moucos para a sociedade civil, no Partido Comunista os mais diversos movimentos sociais – da luta sindical, antissexista, antirracista, dos movimentos campesinos, dos trabalhadores sem teto, do movimento estudantil etc – estão de fato inseridos na estrutura partidária.

Diferente de outros partidos que adotam discursos que não condizem com suas práticas, o Partido Comunista não apenas tem uma mulher negra como presidenta nacional como também tem historicamente, na Nova República, o percentual mais alto de mulheres em sua bancada da Câmara dos Deputados.

Diferente de outros partidos que canibalizam seus aliados, o Partido Comunista historicamente tem sido o portador da unidade como palavra de ordem e articulador da Frente Ampla como necessidade. Lição aprendida com Dimitrov na década de 30, mas também com Marx quando dizia que “cada passo do movimento real é mais importante que uma dúzia de programas”.

Sabemos bem que o Estado é também uma arena da luta de classes, como nos ensinou Poulantzas. Mas, diferente de outros partidos que constroem apenas o próprio hegemonismo e vivem de cargos na burocracia estatal, o Partido Comunista está preocupado com a construção da hegemonia como direção moral e intelectual da sociedade, tal qual no legado de Gramsci. Não se trata de uma ingênua negação da importância da ocupação do Estado. Mas não pode ser só isso. Diga-se de passagem, em recente conversa com um professor que participa de uma corrente de esquerda de um importante partido, ouvi a confissão decepcionada: “as reuniões da corrente são apenas para debater os cargos que os quadros devem ocupar. Parece até que a corrente é um departamento de RH”.

Os comunistas lideram pelo exemplo, costumam dizer por aí. Os “companheiros de viagem inseguros” que quiserem descer do trem possuem essa liberdade. Mas sem desrespeito ou mentiras sobre o partido que lhes estendeu as mãos de forma generosa. Já aos que quiserem entrar agora, sejam todos bem-vindos. A viagem será longa e turbulenta. Aliás, nunca ninguém disse o contrário. Mas pelo destino final vale a pena.

Theófilo Rodrigues é membro da direção do PCdoB no Rio de Janeiro.